Os elementos de transparência no jornalismo guiado por dados

Este livro trata da transparência no Jornalismo Guiado por Dados (JGD), conjunto de saberes e práticas vinculado ao jornalismo digital e em rede, e inserido em um cenário de excesso de informação e desinformação. Está assentada sobre as teorias do jornalismo como forma e formas de conhecimento. Imbricada com valores fundamentais como a verdade e a objetividade, a transparência diz respeito à abertura de processos e decisões editoriais, permitindo que a audiência tenha acesso a informações normalmente assimétricas na relação entre jornal e público. Dessa forma, a autora apresenta a transparência em duas amplas vertentes: como operadora de uma prática ética e como recurso discursivo de legitimação. Para examinar como este valor aparece no produto jornalístico, combina o estudo de casos múltiplos e o estudo de caso como ilustração, observando a cobertura de 11 jornais brasileiros de referência e nativos digitais em relação à pandemia de Covid-19. Como resultado, sistematiza 15 elementos de transparência, distribuídos nos níveis organizacional e operacional, detectados na cobertura feita dentro do JGD e no livro dispostos em ordem alfabética: assinatura, perfil e expertise; contato; correção de erros; data de publicação; documentos; fontes de dados; fontes de financiamento; graus de incerteza; marcas de apuração; manual da redação e princípios editoriais; metodologia; política de diversidade; política de privacidade; tipo de conteúdo; reprodutibilidade e código aberto. Esses parâmetros servem como guia para o que a autora denomina de Protocolo de Transparência no Jornalismo Guiado por Dados, destinado à análise de produtos jornalísticos já publicados. Por fim, detectando uma lacuna teórico-experimental, produz a proposta de Método para o Jornalismo Guiado por Dados com foco na transparência e na reprodutibilidade para implementação em iniciativas jornalísticas orientadas por dados. A pandemia acelerou o processo de incorporação da transparência como valor fundamental para o JGD, demonstrada anteriormente no discurso de profissionais e agora verificada na esfera do produto. A tendência é de que essas mudanças perdurem e se aprimorem, reafirmando o compromisso do JGD de se aproximar da ciência pela via do método para gerar um tipo de conhecimento específico, mais contextual e duradouro.

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“Se a teoria na prática é outra, então há algo errado na teoria.” Com esta constatação, feita há duas décadas, Adelmo Genro Filho nos desafiou a construir uma autêntica Teoria do Jornalismo. Mas, como na mesma época observou Nilson Lage, essa seria uma tarefa para mais de uma geração. A Série Jornalismo a Rigor é uma iniciativa da Editora Insular, em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da UFSC, que vem se somar a este esforço coletivo que já tem história no campo. Objetiva publicar reflexões acadêmicas de alto nível que contribuam para elevar o senso crítico e a qualidade da prática do Jornalismo como atividade intelectual.
Com vocação multidisciplinar, a Série aponta, no entanto, para a construção de uma Teoria do Jornalismo de direito próprio, que responda às questões suscitadas de dentro desta importante prática cultural. Procura assim ajudar na superação do complexo de inferioridade de uma área que se deixou colonizar intelectualmente. Não deixa, com isso, de agregar as contribuições das áreas vizinhas, mas, como propunha Otto Groth, as situa sempre como “ciências auxiliares” da nova disciplina. Busca também enfrentar os muitos preconceitos contra o Jornalismo, gerados em setores acadêmicos e campos sociais outros, e tantas vezes internalizados de forma acrítica pelas escolas de comunicação.
A Série Jornalismo a Rigor entende a Teoria como um percurso que necessariamente se distancia da prática, mas apenas para vê-la de um outro modo. Objetiva voltar a ela para transformá-la, e perde o sentido se ficar no meio do caminho: Paulo Freire advertia que o mero “balé dos conceitos” vira uma atividade supérflua que distrai a vida acadêmica e a afasta da realidade. Como nas Teses sobre Feuerbach, a práxis aqui é vista como fundamento autêntico e finalidade de toda a teoria. A práxis em que está focada a Série é a que ocorre no Jornalismo, produção social de conhecimento diferenciada, estratégica e imprescindível para a sociedade contemporânea. Que, por tudo isso, precisa sempre ser melhor pensada.
Eduardo Meditsch, Diretor da Série Jornalismo a Rigor

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Marília Gehrke é doutora em Comunicação e Informação e pesquisadora no projeto Trust and News Authenticity no Digital Democracy Centre (DDC)/University of Southern Denmark (SDU). Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pesquisou temas como jornalismo guiado por dados, desinformação, fontes e transparência durante o mestrado e o doutorado. Trabalhou como professora no Instituto de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e foi colaboradora da Escola de Dados. Antes disso, atuou como repórter no interior do Rio Grande do Sul.